quinta-feira, março 26, 2020

o que eu me lembro dos primeiros 10 anos

6º dia de isolamento social, me sobra tempo. E de tanto me sobrar, me falta respostas pra tantos questionamentos. Mas um deles vem me chamando atenção: "Eu te conheço?".

Toda cara conhecida, qualquer amigo, no meio do bate-papo, do nada: "O que essa pessoa queria ser quando era criança? Que esporte praticava? O que ela gostava de comer? O que ela assistia na tv?"

Eu comecei a questionar, parei de guardar as dúvidas pra mim. Por mais "meio merda, meio bosta" que sejam. São pessoas queridas. Porque não conhece-los no íntimo? Porque não fazê-los com que se reconectem às lembranças boas de seu passado? Porque não relembrar do meu passado?

E me vi numa grande necessidade de contar pras pessoas quem eu sou. Mas em tempos de internet, amizades de festa e amores líquidos, ninguém parece interessado, ou melhor, ninguém tem tempo e atenção pra te ouvir.

Mas eu não quero esquecer e por isso eu decido escrever.

Eu nasci, numa quarta-feira, 27/07/88, no signo solar caído em Leão, acho que foi às 9h. Ou foi às 6h. Não posso falar compropriedade. É só o que me contam. Na real, essa parte a gente pode pular. Primeiro que eu não me lembro muito bem. Segundo que, com toda certeza, não teve nada de interessante no início da minha vida, como recém-nascida.

Morei minha vida , quase toda, em uma casa. Cercada por instrumentos musicais. E mulheres. Mulheres inteligentes, talentosas, independentes, mas, incrivelmente, nenhuma empoderada.
Me lembro bem das escolas que passei. Me lembro bem do cheiro da sala de instrumentos. Me lembro do radinho azul, amarelo e vermelho, que eu chamava carinhosamente de Diogo. Me lembro do "Fedorento", meu companheiro travesseiro que eu não deixava ninguém lavar. Me lembro que meu pai cortava nossos cabelos estilo "cuia". Eu vivia de calça jeans, botina e blusão da Fiorucci ou da PAKALOLO. As sextas, pagode e muito sertanejo. AMIGOS. Aos sábados, caranguejo em família, papai fazendo minhas unhas, depois passeio na Mesbla. Aos domingos, piscina e churrasco feito pelo meu avô.

Lembro bem do gosto do leite que ele preparava todos os dias as 6h. Lembro do cheiro das manhãs, do perfume de jasmin da minha bisavó, lembro dela. Do toque. Do rosto. Do cabelo. Das tolices. De ter perdido a primeira pessoa que eu mais amava nessa vida pra droga de uma doença. Meu incentivo pra minha evolução espiritual desde os meus 5 anos.

Minha mãe tocava piano. Mas não tenho muitas memórias dela tocando pra mim. Vivia trabalhando. Aprendi sozinha a tocar. Aprendi a ler partituras. Passava tardes tocando Bach, Mozart, Chopin, Vivaldi, Verdi, etc. Ganhei a melhor coleção cds e livros de artistas da Música Clássica. Ganhava horas lendo sobre e escutando as obras de todos. Meu pai. Sempre incentivava.

Aos 7, ou menos, comecei a praticar um esporte. Saltos Ornamentais. Competia. Adorava os maiôs que minha avó me dava pra usar. Não lembro bem se era ela que fazia, mas tenho essa leve impressão. Pouco tempo depois, mesmo amando muito o esporte, parei. Perdi um amiguinho. É o que eu me lembro. Pode ser um truque da minha memória, ou não. Faz tempo.

Papai nunca me deu uma bicicleta. Mas me ensinou a andar de patins e de skate. Nunca quis comprar os móveis da casa da barbie. Mas fez todos de mdp/mdf. Com as próprias mãos. Sempre fazia bonequinhos de durepox, quando ia consertar a pia do banheiro, que vivia vazando. Era ele que escolhia minhas roupas. Por isso a botina amarela. E se abrir meu armário, vai ver que até hoje eu sou apaixonada por elas.

Mamãe, não me lembro de muita coisa. Por muito tempo. Muito trabalho.Deus me livre ela ler isso.

A gente tinha muitos gatos. Valentins. I, II, III, IV, V.............. zero criatividade. Depois de muitos Valentins, veio o Túlio. É, era em homenagem ao jogador. (Esqueci de dizer lá em cima que eu me lembro muito bem da troca do cruzado pro real!)

Meu avô quebrou com o Collor. Vendeu fazendas. Todo dia tinha bicho novo em casa. Foi coelho, cavalo, cachorro, pato...era engraçado. Além dos inúmeros jabutis. Tinha uma tia veterinária, era o que eu queria ser. Mas ela virou administradora. Depois de um tempo, mais adulta, entendi. Desisti da Veterinária também. Mas desisti de muita coisa na vida. Por medo. Por encontro. Por desencontro. Não sei.

Eu tive um pintinho que convivia com meus gatos...pobre pinto. Ah, mas isso foi com uns 13 anos, conto mais pra frente....

Nos mudamos. Perto da minha avó. Meu quarto era laranja. Minha cama era azul royal. Meu pai que pintou tudo. Mesa de vidro na sala. Ainda existe, com a borda quebrada da porta do armário que caiu na cabeça do meu pai e depois na borda da mesa. Nesse apto me lembro de poucas coisas. Pontuais. Intensas. Passarinhos. Agnaldo e Ester, meus ratinhos. Comecei a ganhar mesada. Tinha, pela primeira vez, internet em casa. Usava o napster. Mirc. Assistia Frekazoide. Tv Colosso. E, como boa curiosa, pesquisava tudo sobre o Titanic. Enquanto baixava músicas do Gilberto Gil, primeiro cantor do coração, e jogava jogos de estratégia. 8 anos. Hiperativa. Cozinhava. Acendia cigarro pro papai. Dormia tarde desde já.

1998. 10 anos. Meus pais se separaram. Saímos de casa. O sentimento? Alívio. Felicidade. Não aguentava mais as brigas diárias deles. Voltamos pra casa da vovó. E assim terminam os 10 primeiros anos da minha vida. Com muita coisa ainda esquecida. Muita coia por falar.

Ah, sabe meus ratinhos? Agnaldo e Ester? Quando nos mudamos, foram doados pro Kaveira alimentar a cobra dele.

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